Mamãe
Galinha ficou com os seus filhos sobreviventes na casa da família Pato. Com o
passar dos dias mamãe Galinha percebe que a família Pato tem muita compaixão.
Ela e seus filhos não querem que seus ajudadores se preocupem em demasia e
fingem estarem bem. Não compartilham com eles sua dor, deixam de chorar,
aparentam que não aconteceu nada. Entretanto todos estão confusos: ficam de
mau-humor, vivem com medo, não querem conversar, e até ficam largados pelos
cantos. Querem que todos façam tudo por eles. Às vezes, inclusive, sentem que
toda ajuda que recebem é muito pouco e se queixam.
Os pintinhos sentem-se cada dia piores. Maria sente dor nas
asas. Sebastião tem dores nas patas e está chateado. Leonor quer dormir o tempo
todo e sonhar com seu pai, com Pedro e sua casa. Mamãe Galinha tem fortes dores
de cabeça, está de mau-humor e frequentemente é grosseira com os demais. Por
qualquer coisa castiga os filhos e todos sofrem.
Depois de algumas semanas, a família Pato decide que é
preciso fazer algo a mais e procuram o doutor Coelho. Quando o doutor Coelho
chega e examina a todos cuidadosamente a todos e diz:
_ Estão todos muito bem!
Mamãe Galinha com seus pintinhos inclusive a família Pato
se surpreendem com tal diagnóstico. _ Mas sinto dor na asa – disse Maria.
_ E eu na pata – disse Sebastião.
_ Sim - disse o doutor Coelho – Vocês estão
fazendo o melhor que podem para se recuperar desta tragédia sem incomodar os
outros. Vocês não estão tão mal como alguns outros animais da granja.
Explicarei o que esta acontecendo – prosseguiu o sábio doutor Coelho – Alguma
vez vocês já comeram demais e sentiram dores em todo o corpo?
_ Sim – respondeu mamãe Galinha.
_ E como se livraram do incomodo?
_ O melhor é vomitar – replicou mamãe Galinha – pois mesmo
que tomemos remédios, se não vomitamos o incomodo perdura por muito tempo.
O doutor coelho sorri, olha para eles e lhes pergunta:
Depois de vomitar, como vocês se sentem?
_ Melhor – afirmou Maria.
_ Isso mesmo! – disse com entusiasmo o doutor Coelho. -
Quando alguém come demais e fica com indigestão, o corpo pede para vomitar a
fim de aliviar-se.
_ Não entendo o que tem a ver uma indigestão com a minha
dor na pata – comenta Sebastião.
_ Bem – disse o doutor – Vocês engoliram um susto muito
grande, muita dor, muitas perdas ao mesmo tempo. Por isso o corpo de vocês
responde com dor na pata de Sebastião; e pra Maria na asa; e Leonor quer dormir
o dia todo e mamãe fica de mau-humor. É necessário vomitar toda a dor,
desafogar-se, deixar que saia. É necessário falar do que sentem. Inclusive é
saudável chorar quando se sente uma grande dor. Vocês não podem fazer nada para
mudar o que já aconteceu. Agora é tempo de reconhecer as perdas e chora-las.
Dessa forma vocês se aliviarão. Logo vocês poderão pensar e meditar na
melhor maneira de reorganizar a vida, reconstruir sua casa, colocar as coisas
em ordem, colaborar com os vizinhos e seguir adiante. Conheço alguns habitantes
deste vale que quando passam por uma tragédia, se isolam, não querem vomitar
sua dor, não colaboram e tornam-se apáticos. Então a cada dia sentem-se piores
e é bem provável que fiquem doentes.
Mamãe Galinha e seus pintinhos ficaram muito quietos,
escutando com muita atenção as palavras do doutor Coelho. Cada um disse em voz
baixa: “É verdade”. O doutor Coelho aproveitou a atenção de toda família e
continuou:
_ Que bom que seus vizinhos lhes ajudaram. Que bom que
vocês aceitaram a ajuda da família pato e a minha. Na medida em que vão
aceitando o que aconteceu, conforme vão expressando sua dor junto a amigos e
vizinhos compreensivos, conforme vão recobrando a confiança de pedirem o que
querem e dizer “não” ao que não querem e vão participando com os demais na
reconstrução de toda a granja - disse o doutor – irão sentindo-se melhor.
_ Ah... entendo... – disse suavemente mamãe Galinha,
enquanto olhando as arvores que haviam permanecido em pé após a avalanche.
Os pintinhos se acomodaram em seus assentos e se olharam
uns aos outros enquanto o doutor Coelho guardava seus instrumentos em sua
maleta.
_ Bem amigos – disse o doutor despedindo-se de cada um –
lhes desejo uma pronta recuperação, e que depois desta experiência tão dolorosa
todos vocês se tornem mais fortes e mais sábios.
E nossos amigos fizeram como o doutor lhes havia dito. Á
noite, antes de dormir, sentavam-se e conversavam sobre como se sentiram
durante o dia. Às vezes choravam ao lembrarem-se dos velhos tempos, mas já não
era um choro desesperado. Pelas manhãs com frequência sentiam falta do canto de
papai. Todos se recordavam de Pedro com muito carinho e falavam com saudades
dele.
E o tempo seguia a sua marcha. Os pintinhos cresciam e
aprendiam coisas novas. Mamãe Galinha estava novamente ativa e alegre, buscando
comida, conversando com seus vizinhos. A granja tornava a ter vida.
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